Varias gestoras de investimentos ampliam suas opções de produtos que já trazem diferentes ativos de renda fixa e variável em um só lugar, balanceados conforme a tolerância ao risco do cliente
Com tantas opções de investimentos disponíveis, a tarefa de escolher os melhores produtos é árdua para quem não entende muito do assunto. Imagine, então, para quem não está afim de estudar profundamente o mercado, também não quer um assessor de investimento no pé e nem pagar para um consultor de valores mobiliários fazer o trabalho. Pensando nesse público, as gestoras estão apostando em produtos completos, já diversificados, que oferecem de uma vez só investimentos em diferentes ativos de renda fixa e renda variável, no Brasil e no exterior (em alguns casos), e balanceados conforme o apetite ao risco freguês.
As chamadas “carteiras de investimentos” ou “fundos de alocação” não são exatamente novidade, mas a sua popularização sim – e eles ganham tração com a chegada de novatos ao mercado financeiro, em busca de alternativa ao juro baixo.
“A simplificação é uma tendência. As pessoas têm cada vez menos tempo, querem soluções tecnológicas para lhes poupar esforços e tempo. Quem gosta de estudar e escolher seus investimentos já tem muitas opções no mercado. Quem tinha pouca solução a baixo custo é quem delega a escolha”, diz Lucas Radd, responsável por portfolios e advisory do Inter Invest, divisão de investimentos do Banco Inter.
A oferta segue a demanda e diversas gestoras lançaram produtos do tipo nos últimos anos, seja os tradicionais Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, Santander, Safra e Caixa, bem como os mais novos Vitreo, Warren, Magnetis, Vérios, Guide, Inter, XP e Nubank.
Estima-se que a indústria já tenha R$ 130 bilhões alocados neste segmento. O Itaú é o que concentra os maiores volumes: seus quatro fundos que seguem o modelo “carteira” somam R$ 38 bilhões de patrimônio líquido e 337 mil cotistas – só em maio, foram R$ 3 bilhões captados nesses produtos.
“A grande questão é que é difícil fazer uma carteira diversificada na pessoa física. Quando montamos produto lá atrás, a ideia foi essa: dar acesso a partir de um real a uma carteira que englobe tanto ativos no mercado local como internacional. É a resposta para aquele investidor que se pergunta onde poderia investir se só quisesse investir em uma coisa”, diz Stefano Catinella, responsável pela distribuição de terceiros da Itaú Asset.
É neste ponto que os fundos alocação se diferenciam de fundos multimercados e fundos de fundos (FoFs) tradicionais. No caso dos FoFs, a maioria é focada em apenas uma classe de ativo, como fundos de ações ou multimercados. Podem ter, naturalmente, uma carteira diversificada mas esse não é o objetivo principal e sim escolher os melhores gestores e fundos dentro de cada categoria.
Já no caso dos fundos multimercados, mesmo que tenham uma carteira composta às vezes por diferentes classes de ativos, o objetivo não é oferecer uma solução única de alocação para o cliente, mas sim a busca por maximizar o retorno ajustado ao risco, mesmo que isso envolva eventualmente ter proteções. Outra diferença é que o fundo multimercado tradicional se movimenta com notícias e eventos, enquanto o fundo alocação mexe menos na distribuição do portfólio, e sempre procura ter visão mais holística e não no nível micro, como, por exemplo, o impacto da alta da inflação na curva de juros futura (já que são os gestores dos fundos investidos que estão vendo isso)
“Gastamos energia nos grandes temas e sempre pensando em longo prazo. Temos um comitê mensal para analisar se são necessários e ajustes táticos”, explica Milena Gordon Landgraf, gestora de portfólio da Itaú Asset.
O principal benefício desse tipo de produto é a diversificação, comprovadamente importante para dar retorno e proteger de riscos, ao diminuir a volatilidade (sobe e desce de preços). Os valores baixos para aplicação inicial também chamam a atenção. Com R$ 1 já é possível aplicar em diversas classes de ativos. Isso faz com que o grande público seja mesmo o de pessoas físicas.
Opções hoje no mercado de fundos de investimentos já diversificados
Fundo | Patrimônio do fundo (R$ milhões) | Retorno em 2021 (até abr – Em %) | Retorno em 12 meses até abril de 2021 (Em %) | Número de cotistas |
BB Carteira | 3.375 | 1,3 | 7,0 | 38.702 |
BB Carteira Investimento Plus | 457 | 4,0 | nd | 9.084 |
Bradesco Alocação Arrojada | 1.042 | -0,9 | 3,4 | 10.287 |
Bradesco Alocação Dinâmica | 2.461 | -0,7 | 2,5 | 20.847 |
Bradesco Alocação Moderada | 900 | -0,6 | 2,0 | 11.947 |
Bradesco Multigestor | 676 | -0,1 | 2,3 | 8.222 |
BTG Access Balanceado | 279 | -0,2 | 13,6 | 1.712 |
Caixa Multigestor | 460 | 0,2 | 7,2 | 3.580 |
Guide AAA Allocation | 111 | 1,5 | 10,1 | 1.615 |
Inter CarteiraWinArrojada* | 1 | nd | nd | 1.106 |
Inter CarteiraWinModerada* | 1 | nd | nd | 805 |
Intr Selct Mlt Estrtg | 30 | 0,1 | 11,4 | 9.734 |
Itaú Carteira Agressivo | 83 | 0,3 | nd | 1.162 |
Itaú Carteira | 15.318 | 0,5 | 15,8 | 172.702 |
Itaú Seleção Multifundos | 8.223 | -0,3 | 5,1 | 99.106 |
Itaú Seleção Multifundos Plus | 4.733 | 2,6 | 15,7 | 22.809 |
Safra Allocation Dynamic | 13 | 0,5 | 15,1 | 310 |
Safra Allocation Moderate | 27 | 0,5 | 12,7 | 432 |
Safra Faraday Special | 1.110 | 1,4 | 11,4 | 10.179 |
Santander Carteira Crescim | 69 | -0,9 | 9,3 | 9.145 |
Santander Carteira Dinâm | 30 | -1,0 | 13,5 | 3.686 |
Santander Carteira Equilíb | 81 | -0,6 | 5,4 | 11.000 |
Vitreo Carteira Universa | 1.385 | 2,2 | 17,0 | 28.244 |
Vitreo FOF Melhores Fundos | 916 | 3,0 | 19,4 | 25.112 |
Warren Omaha | 61 | 5,1 | 14,5 | 19.587 |
XP DNA Brave | 43 | 3,2 | nd | 11.816 |
XP DNA Defense | 93 | 1,4 | nd | 6.037 |
XP DNA Energy | 272 | 2,6 | 19,2 | 31.146 |
XP DNA Serenity | 103 | 1,2 | nd | 7.279 |
XP DNA Strategy | 435 | 1,8 | 12,5 | 23.883 |
XP DNA Vision | 210 | 2,2 | 16,0 | 20.609 |
Landgraf, do Itaú, explica que o processo montagem de carteira segue um ritual em que primeiro é feita uma análise de alocação estratégica. Na prática, isso quer dizer que o time define, a partir de diversos cálculos, qual a composição ideal da carteira por classe de ativos. A cesta de opções é grande: ações brasileiras, fundos multimercados, fundos de ações, moedas, ouro, ações internacionais, títulos públicos, debêntures, entre outros. Depois, é pensado qual o melhor instrumento ter a exposição: via ETF [fundos espelhos de índices], em ações, títulos públicos ou cotas de outros fundos, por exemplo.
“Identificamos que classes de ativos alocadas ao longo do tempo vão trazer os melhores retornos balanceados ao risco. É difícil acertarmos todos os anos a classe de ativos vencedora, mas se tiver uma carteira diversificada e com exposição ao risco e proteções no momento necessário, é possível ter bons retornos”, pontua Landgraf.
A estratégia, portanto, é uma mistura de gestão ativa, em que o time de gestão escolhe ativamente quais ativos colocar na carteira, e parcialmente passiva, quando delega para outros, por meio de fundos de investimentos geridos por terceiros ou ETFs.
O interesse pelo produto na XP foi tamanho que o patrimônio dos sete fundos do tipo — que levam o nome de família DNA — triplicou do fim de 2020 para cá, hoje em R$ 1,5 bilhão. Em média, os clientes deixam R$ 30 mil alocados. Para muitos, esse é todo seu patrimônio, já que a intenção do produto é substituir a necessidade de ficar mexendo na carteira. Essa é outra vantagem do produto: o gestor já aumenta e diminui as parcelas de renda fixa, variável e internacional conforme os eventos econômicos para o cliente.
“Nossa profissão é tocar esses fundos. Todo mês analisamos o cenário, recalculamos e refazemos o processo para saber se a carteira continua fazendo sentido. Tem momentos em que ficamos meses com a mesma alocação e outros em que o cenário exige alocações rápidas”, conta Felipe Dexheimer, gestor da XP Allocation.
Objetivo das carteiras
O objetivo das carteiras é possibilitar que os investidores menores — os que não têm pelo menos R$ 1 milhão na conta para serem atendidos pelas áreas de private e wealth dos bancos e plataformas — tenham acesso a serviços sofisticados. “A área de alocação nasceu para atender o segmento de alta renda do banco. Aos poucos, conseguimos dar acesso a todos os clientes aos portfólios completos, que têm mais de 30 fundos cada um”, conta Radd, do Inter Invest. O banco Inter lançou dois produtos do tipo, as carteiras da família WIN moderada e arrojada.
Outro benefício é o acesso a fundos ou outros ativos que não são tão fáceis de se comprar se seu bolso é pequeno. “Normalmente, tenho acesso a fundos não disponíveis para investidor em geral, seja porque é exclusivo para institucionais e qualificados, os mínimos são impeditivos ou porque só pode ser investido fora do país”, diz Rafael Mazzer, sócio do banco BTG Pactual e responsável pelo time de alocação.
Para ele, o fato de ter em casa um time dedicado a escolher os melhores ativos, nacionais e internacionais, faz diferença na hora de ter produtos do tipo alocação. No BTG, essa equipe é formada por 30 pessoas. O serviço, antes concentrado nos clientes endinheirados, agora vai ganhar mais espaço na plataforma digital.
“Vamos lançar em breve a família Autoinveste, que usa estratégia de alocação e oferece um nível de entrada menor e privilegia liquidez”, conta o sócio do BTG, antecipando ao Valor Investe que o lançamento deve ocorrer em um mês os fundos terão mínimo de R$ 1 e resgate em até 10 dias. Até agora, o principal produto de diversificação da casa era o fundo BTG Access Balanceado.
Outra facilidade desse tipo de produto é mais operacional – como se investe apenas em um lugar, não é preciso declarar dezenas de ativos na Declaração de Imposto de Renda e nem fazer diversas operações de compra e venda de ativos e pagar taxas de corretagem, além de impostos.
“Esse tipo de produto tem vantagem tributária grande. Não há incidência de imposto dentro do fundo para qualquer rebalanceamento e alteração de alocação, o que pode gerar mais retorno para investidor em comparação a fazer isso de forma individual”, lembra o gestor de investimentos da Warren, Igor Cavaca.
Caso isso fosse feito de forma individual, diz, a cada resgate o investidor tem que pagar no mínimo 15% do retorno em impostos, o que leva a reinvestir um valor menor. “Com rebalanceamentos ao longo do tempo essa soma pode ser bastante considerável”, afirma.
O modelo de negócio da Warren é justamente baseado na administração de carteiras, mas a casa também tem fundos que podem ser entendidos como carteiras bem diversificadas, a exemplo de Warren Omaha e Warren Multigestores.
Desvantagens
Um ponto contra desse tipo de produto é que a decisão sobre o investimento está na mão do gestor. Mesmo se quiser, portanto, o investidor não consegue alterar algo específico da estratégia de alocação do fundo.
Outra desvantagem é que, como tudo na vida, a comodidade tem um preço. No caso dos fundos de alocação, a taxa de administração cobrada varia por casa e produto, mas está na faixa de 1% a 1,5% ao ano. Se para produtos mais arrojados pode parecer OK, para quem é mais conservador, que não tem um grande diferencial, é um preço alto.
Os gestores, como explica Mazzer do BTG, até se valem de ativos mais baratos para o cliente, como ETFs, por exemplo, mas isso precisa estar alinhada com a estratégia, ou seja, fazer sentido o equilíbrio da carteira.
Além disso, há um custo embutido que passa despercebido: todas as taxas e corretagens pagas para a construção e rebalanceamento das carteiras. Apesar de as gestoras se valerem de rebates de fundos e descontos pelo alto volume movimentado, para diminuir o custo, ele está lá e a gente não vê. Mais uma vez, para perfis que topam um pouco mais de risco pode fazer sentido e sair mais barato do que se fosse investir sozinho; porém, para alguém que se contenta com ativos de renda fixa, pode ser mais custoso. Desse modo, a principal dica é avaliar a carteira proposta (que pode variar bastante entre as gestoras) antes de apertar o play.
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